terça-feira, 24 de janeiro de 2017

O corpo nu

Ofendem-se com a corporeidade.
A carne, temerária, é algo a ser evitado.
O nu não me reflete o sofrimento humano,
a transparência do meu coração.
O nu, dizem, denota a exacerbação do desejo.
E desejar é perigoso,
faz do corpo ocupações de afeto:
alguém que abraça
e que beija.
A religião se esqueceu do corpo,
preocupada que estava com a saúde d’alma.
Protegida em suas indumentárias.
Olvidam-se que a primeira circunstância para amar
o corpo materializa.
Mas num mundo de corporeidades alienadas
o nu é subversão.
Cubra-te, pois, ó Cristo, a carne crua.


terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Saudade e carestia


No amor há sempre uma saudade.
Carestia do ato de amar.
Se se está perto, saudade na distância que há na proximidade.
Uma distância voraz incessante.
Se longe, saudade da contemplação,
saudade da consumação de corpos na unidade,
abreviação da distância insistente.
No amor há sempre uma saudade e carestia,
um querer a mais,
um querer...
mais.

Sonhar-te-emos


Sonhar-te-ei desde o alvorecer da juventude, 
entre os cantos das aves matinais e o jardim orvalhado da noite.
Sonhos prenhos de desejos intimados 
do gozo dos tempos infindados no teu beijo,
mas de sonhos também violentados,
como as perdas imprevistas,
como o coito forçado. 
Sonhar-me-hei ausente da felicidade, 
porém, sem sentir tristezas; 
o momento é o que há.
É como o céu ou o inferno, que me importa,
se é na lida que faço e me desfaço a vida inteira?
E os sonhos... Ah, eles deliram as gentes. 
Deus o sabe.
Antes que o Verbo se fizesse carne
ele foi sonho.
Talvez ainda o seja. 
Só que agora sonhamos juntos 
e os meus sonhos movem o mundo.